Dicas de Livros | Blog A Taba
O visconde partido ao meio

O visconde partido ao meio

A fama de leitor voraz de Italo Calvino não deixa dúvida do quanto as suas leituras pregressas das grandes obras da literatura tiveram influência em sua escrita. Mas o que surpreende nos seus livros é a originalidade manifesta na criação das suas histórias. Nesse sentido O cavaleiro inexistente é exemplar, pois tira proveito da tradição das novelas de cavalaria medievais, relaciona-se indiretamente com o D. Quixote de Cervantes e oferece, por fim, um exemplar do gênero pleno de frescor renovado. Muita coisa nesse romance intriga, a começar pela narradora, uma freira que cumpre como penitência a tarefa de escrever a história do cavaleiro Agilufo, figura excessivamente cartesiana que excepcionalmente inexiste enquanto matéria, mas se manifesta dentro da uma armadura impecável.


Resenha
A fama de leitor voraz de Italo Calvino não deixa dúvida do quanto as suas leituras pregressas das grandes obras da literatura tiveram influência em sua escrita. Mas o que surpreende nos seus livros é a originalidade manifesta na criação das suas histórias. Nesse sentido O cavaleiro inexistente é exemplar, pois tira proveito da tradição das novelas de cavalaria medievais, relaciona-se indiretamente com o D. Quixote de Cervantes e oferece, por fim, um exemplar do gênero pleno de frescor renovado. Muita coisa nesse romance intriga, a começar pela narradora, uma freira que cumpre como penitência a tarefa de escrever a história do cavaleiro Agilufo, figura excessivamente cartesiana que excepcionalmente inexiste enquanto matéria, mas se manifesta dentro da uma armadura impecável. A certa altura Agilufo alia-se ao aspirante a cavaleiro, o impetuoso Rambaldo, e toma como escudeiro o atrapalhado Gurdulu. É a partir desse encontro que a narrativa toma impulso, e além do fabuloso que vibra nos episódios narrados, também estimula densas reflexões, a começar pelo sentido da guerra, coisa tão absurda quanto um cavaleiro que inexiste, nesse ponto vale advertir que o adolescente incursiona pela aventura numa linguagem requintada pelo poético, sem concessões quanto aos temas desenvolvidos..
Trecho do livro
“Rambaldo arrasta um morto e pensa: ‘Ó morto, corro, corro para chegar até aqui como você, a me fazer puxar pelos calcanhares. O que é esta fúria que me empurra, esta mania de batalhas e amores, vista do ponto onde observamos seus olhos arregalados, sua cabeça virada que bate nas pedras? Penso, ó morto, você me obriga a pensar; mas o que muda? Nada. Não existem outros dias senão estes nossos dias antes do túmulo, para nós, vivos, e também para vocês, mortos. Que me seja concedido não desperdiçá-los, não perder nada daquilo que sou e daquilo que poderia ser..’.”
P. 50