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Pode pegar!: o livre brincar como ato transgressor

Pode pegar!: o livre brincar como ato transgressor

“Pode pegar”, de Janaína Tokitaka, celebra o livre brincar com a história de dois coelhos que trocam vestimentas para viajar na imaginação


Uma brincadeira incomoda muita gente? No caso de Pode pegar!, de Janaína Tokitaka, isso pode, sim, ser verdade. Enviada neste mês pelo Clube de Leitores A Taba no para os leitores bebês, a obra, publicada pela editora Boitatá, traz a história de dois coelhos que brincam com vestimentas, trocando seus acessórios para realizar suas grandes aventuras.

Pular uma montanha, tornar-se um super-herói a voar e salvar pessoas, nada disso é impeditivo para os personagens. Ainda mais se depender de suas vestimentas, que eles trocam e destrocam entre si ao longo da narrativa. O livro só enfatiza como o ato de brincar é essencialmente transgressor, mesmo que não seja visto com escândalo pelas crianças. Afinal, elas estão acostumadas com o lúdico.

É no brincar que percebemos “como a criança interpreta e ressignifica o mundo ao redor dela”, lembra a escritora e ilustradora, que tem mais de 40 obras publicadas. “Acabamos observando construções sociais profundas, dentre elas questões de gênero, raciais ou de classe”.

Mas isso é leitura dos adultos, que enxergam a história como tratando de relações de gênero. Para as crianças, ao menos nestes últimos três anos desde que o livro foi publicado, a brincadeira é o que mais importa, tratada com a naturalidade de quem vive o universo do faz de conta no dia a dia. “A lógica narrativa usada foi a da brincadeira, uma lógica muito próxima à realidade delas e que conversa com o público de maneira horizontal e honesta”, explica.

E a brincadeira é tão essencial em Pode pegar! que a ideia para a criação do livro surgiu enquanto Janaina Tokitaka observava duas crianças brincando com um pedaço de tule. Depois, ela visitou o Museu de Arte de São Paulo, o MASP, para aprofundar a sua pesquisa. Foi ali que escolheu a paleta de cores do livro, rica em tons de rosa e azul. Pegou elementos emprestados dos quadros que via: um sapatinho de um quadro do século XIX, uma gola do século XVIII… “A ideia era que eles parecessem ‘antigos’ ou pertencendo a outro tempo quando usando só códigos ‘femininos’ ou ‘masculinos’ e mais contemporâneos quando misturassem tudo.”

Dessa pesquisa resulta um livro sobre liberdade e, sobretudo, sobre o livre brincar. Uma narrativa que apresenta às crianças desde cedo diferentes possíveis maneiras de existir no mundo. Em uma realidade cheia de “não pode”, Pode pegar! abre espaço para o sim, para o “você pode ser como quiser”, ou, no caso da brincadeira, você pode ser quem quiser e viver as aventuras que desejar viver. Um sapato ou um pedaço de tule não devem ser impeditivos para imaginação e a descoberta de possíveis realidades.