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O que é folclore?

O que é folclore?

Você sabe o que é folclore? Como surgiu? Qual seu lugar nas sociedades atuais? Saiba mais sobre o assunto.


Caso você pesquise, rapidamente encontrará referências sobre o que seja folclore e todas muito semelhantes: uma explicação sobre o significado da palavra e exemplos. 

Na explicação você vai identificar que ele é um campo de estudo sobre o saber popular e que o termo tem origem no inglês, na palavra FOLK-LORE (povo – conhecimento) criada por Williem John Thoms em 1846. 

Nos exemplos, você talvez alargue sua compreensão e veja que não são só as tradicionais lendas que compõem esse campo de estudo, mas também festas, comidas, remédios e até gestos, pois são as práticas antigas e anônimas que circulam continuamente na comunidade que fazem parte do folclore.

Mas, seriam essas informações suficientes para entendermos mesmo o que significa folclore? Suficiente para compreendermos qual é o critério que informa o que é e o que não é folclore? Suficiente para entendermos por que não havia folclore antes do século XIX ou o porquê de ele ser valorizado a ponto de ser um conteúdo trabalhado na escola? Acreditamos que seja importante conhecer um pouco mais…

Vamos seguir as questões. Qual o critério que informa o que é e o que não é folclore? É fácil localizar quais são os conteúdos que podem (ou não) fazer parte dele? 

Você pode se surpreender, pois se decidir fazer uma listagem do que deve ou não ser incorporado, verá que não é tão simples assim. Quer ver?

O que é folclore?

‘Conhecimento do povo’, ‘saber do povo’, ‘cultura popular’ são expressões normalmente utilizadas, mas você já se perguntou a que grupo as palavras POVO e POPULAR designam? Talvez, num passado distante, ela pudesse se referir às pessoas sem acesso econômico e educação formal, mas desde que se desenvolveu a cultura de massa, onde o popular passou a se referir ao volume de consumo (como uma novela popular ou uma música popular), o critério anterior deixou de fazer sentido, pois pessoas ricas e altamente instruídas passaram a incorporar os índices da popularidade.

Esse exemplo concreto deixa em evidência um ponto importante que muitas vezes não damos atenção: o chamado ‘conhecimento do povo’ é um campo de estudo, portanto o que cabe e o que não cabe nele depende do recorte estabelecido por quem estuda. 

A chamada ‘cultura popular’ não está na realidade das coisas – a quermesse, a mezinha, o curupira -, mas no critério definido pelo pesquisador. Sendo assim, não há homogeneidade naquilo que chamam folclore.

Sem um critério único de definição e inexistente antes do século XIX? Como assim? A informação anterior – sobre os pesquisadores definindo o que vão estudar – já nos ajuda: não é que não existissem práticas culturais populares (inclusive a expressão ‘cultura popular’ circula na Europa desde o século XVIII), mas essas práticas não haviam se transformado num campo de estudo. Ok. Mas cabe a pergunta: por quê?

Pergunta importante que vai explicar o nascimento de um interesse, mas também motivos para seu declínio ao longo do século XX. A resposta? A ciência. 

Antes, as pessoas recorriam igualmente a médicos e curandeiros; o remédio da farmácia valia tanto (ou às vezes menos) do que o chá caseiro; os seres encantados eram tão reais quanto os de carne e osso… O que isso quer dizer? Que a sabedoria popular foi sendo desqualificada na proporção em que a ciência foi tomando o lugar da verdade das coisas. 

Entretanto, apesar de serem, pejorativamente, tomadas como ‘crendices’, as práticas populares não deixavam de ser praticadas. 

A inquietação sobre esta permanência, considerando-a como característica de um povo, inspirou estudiosos.

E como houve uma desvalorização do folclore? Voltamos ao fato de que o folclore não são as atividades, mas o recorte do pesquisador, então, o que está em questão não são as festas, a literatura ou os gestos que atravessaram séculos formando a comunidade, mas sim, os procedimentos de quem os investigava. 

Assim, foi possível que elementos nacionais (brasileiros, no caso) fossem valorizados, mas existisse uma desqualificação dos métodos dos folcloristas.

O fortalecimento da metodologia científica, sobretudo nas Ciências Sociais, distinguia-se dos modos dos folcloristas e eles foram vistos como o de simples colecionadores de dados, como antigos antiquários.

Essas tensões existiram no âmbito das universidades e não chegaram a macular o repertório que era apresentado na escola. Neste espaço, mais importante do que a metodologia utilizada era a construção de uma memória e de uma identidade comum. A cultura popular como um patrimônio cultural.

Qual o lugar do folclore nas sociedades atuais?

Apesar do importante papel na construção dos imaginários nacionais da Europa do século XIX ou do Brasil da década de 1930, o avanço de saberes científicos com questionamentos diante de conceitos como tradição e cultura popular, esvaziaram o folclore como um campo de estudo.

Por exemplo, a manutenção da tradição sempre foi uma das diretrizes dos folcloristas, mas como combiná-la com o crescente valor da ideia de modernização?

Como diz a historiadora Martha Abreu:

“Os folcloristas e o folclore passaram a receber críticas profundas por defenderem uma prática tida como não-científica (…) e por ficarem identificados às forças mais conservadoras de uma sociedade que rapidamente se transformava…”

A sociedade e as categorias de estudo se transformavam. Na história, por exemplo, a ideia da ‘cultura popular’ foi revista, pois as investigações provaram que ideias e práticas não vivem confinadas e que os grupos estão sempre trocando referências e se atualizando, num movimento dinâmico que os alteram. 

Dito de outro modo, foi desacreditada a ideia de que havia uma separação entre a cultura erudita e a cultura popular, como se pensava antes. A vida era um pouco mais misturada e complicada.

É bom lembrar dessa ideia de movimento e atualização, pois muitas vezes deixamos escapar que as práticas nunca se mantêm exatamente iguais: as comunidades mudam e as conexões que as pessoas possuem com o passado também mudam.

Entretanto, no fim do século XX, o folclore voltou a ser mencionado de modo positivo. Houve uma demanda de buscar as raízes, as origens, pois as novas tecnologias – como a Internet – atingiram os sentidos de tempo e espaço.

A sensação de aceleração alcançou a todos e o receio sobre o futuro fez as pessoas temerem perder o passado. 

Intensificou-se a preocupação com o patrimônio, material e imaterial e, deste modo, a ideia de preservação de bens e de práticas sociais trouxe novo fôlego ao folclore.

Folclore brasileiro

Correndo à margem da universidade, os folcloristas brasileiros foram homens e mulheres com muitas outras atividades, mas que mantinham acesa sua paixão e interesse sobre a cultura popular.

Alguns nomes conhecidos em outros campos se destacam, como os literatos Mário de Andrade e Cecília Meireles ou os músicos Inezita Barroso e Luiz Carlos Barbosa Lessa, mas quem mais representa a pesquisa sobre o folclore brasileiro é Luís da Câmara Cascudo. 

Formado em Direito e jornalista na prática, seu fascínio sobre o folclore garantiu a formação de muitos além de inúmeros livros, tais como “Antologia do folclore brasileiro” (1944); “Lendas brasileiras” (1945); “Contos tradicionais do Brasil” (1946); “Geografia dos mitos brasileiros” (1947); o clássico “Dicionário do folclore brasileiro” (1954) e até mesmo uma “História da alimentação no Brasil “(1963-1967).

Lendas, parlendas, mitos, trava-línguas, adivinhas, receitas… há um mundo de saberes que passaram de geração em geração, atravessando séculos e continentes, saberes que nem sempre identificamos a origem, mas reproduzimos e damos continuidade, ensinando a filhos, sobrinhos, netos, alunos.

O Brasil, na sua continentalidade e nas muitas culturas que reuniu, é um manancial de práticas populares que podem e devem ser compartilhadas. Os livros para a infância e juventude podem ser parceiros nesse processo. 

Deixamos aqui algumas indicações preciosas para ampliar o conhecimento sobre o tema e explorar com as crianças.